Crónicas

Socialismo Covid

...pois é, camarada, era óbvio que o aval nunca iria chegar a tempo de cobrir o empréstimo urgente para impedir o colapso económico-social do sistema, e assim vamos ter que pagar capital e juros com língua de palmo, só o senhor Sócrates é que dizia que essas dívidas não se pagam, mas isso era ele, que sabia do que falava, e agora restam as promessas falidas e falhadas, um certo “mistério” na recusa do aval, ou talvez não, dizem que daqui falam muito alto e que daquele lado ouve-se tudo, pois claro, os ouvidores do reino são mais que muitos, e nem a fala do supremo magistrado nos valeu, de novo colónia da república socialista portuguesa, chutados da jangada lusitana pela altíssima pressão do novo coronavírus, a morbilidade a afetar seriamente o quotidiano dos portugueses, já há muita gente que respira mal e não consegue pensar direito, mas há também fortes receios de que o vírus esteja a afetar o “miolo” dos nossos PPP (pobres pais da pátria), o que talvez seja uma explicação para o mistério do aval que não chegou, naufragado algures entre as Berlengas e as Desertas, mas, é claro, os grandes mandantes fazem de conta que não se passa nada, silêncio, já conhecemos de longe aquela calma asiática do grande chefe, o cinismo da propaganda no país das maravilhas, afinal um pobre retângulo que arde no verão e mete água por todos os lados quando a invernia chega, mas calma, está tudo sob controle, diz o mestre na arte contorcionismo negocial, agora a tentar atar as pontas soltas da geringonça para embrulhar o orçamento “venezuelano”, levar a leilão pacotes de assistencialismo em vez de investimento, vem aí uma pipa de massa, o socialismo gosta de distribuir e o covid explica o resto, pois então, mas há sempre uns tipos a deitar areia na engrenagem, falam demais, juízes e jornalistas vêm fantasmas por todo o lado, e não é que, de repente, tínhamos a pátria já num alvoroço, só se falava de corrupção e clientelas, não percebem que a bazuca europeia é uma boia de salvação maior que o país, diz o chefe, uma algazarra infernal nos telejornais, mas qual corrupção qual carapuça, e eis que então vem ao de cima a longa memória reptiliana que facilmente transforma um adversário em inimigo, há que abafar a vozearia de bloqueio, sanear e expurgar onde necessário, camarada, o poder tem que ser exercido com serenidade mas sem contemplações, a vindicta tarda mas aparece, o que, diga-se, pode ajudar a explicar o mistério do aval perdido, há muita pressão, claro, o socialismo covid não é uma metáfora, a pandemia não dá tréguas, percebe isto, camarada, há um modo socialista de fazer as coisas, afastar os desalinhados, aconchegar os apaniguados, e repartir a pipa de massa em doses cavalares, temos experiência disto, o úbere europeu nunca nos falhou, trinta anos e milhões de milhões depois é o país que temos, subdesenvolvido mas alegrete, ética e rigor não enchem barriga, há sempre o sol dos algarves e mais eleições e poder a disputar, mas primeiro temos que livrar-nos do rei corona, e de mais uns quantos pelo meio, diga-se, que o covid está a tirar muito boa gente do sério, mas calma, há sempre o “garante” contra a crise na república socialista portuguesa, agora em formato covid, evidentemente, e a negra estatística faz brotar novo oráculo estratégico, vamos ter que repensar o Natal, nada de facilitar a vida ao corona em convívios pantagruélicos, há que deixar cair o natal da orgia consumista, da foleirice engalanada das coisas belas e inúteis dispersas pelas noites bêbadas dos mercados e, recomendação covid, voltar ao natal frugal e íntimo à imagem do presépio, com animais e tudo, terra e natureza a condizer, um refúgio de resiliência antes da turbulência que virá, a fome e a bazuca irão trazer evolução na continuidade para o socialismo covid, camarada...

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