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Quo vadis Jurisdição Administrativa e Fiscal?

A quem é que interessa que os TAF funcionem sistematicamente mal?

Conforme decorre da Constituição “os tribunais da Jurisdição Administrativa e Fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.” Trocado por miúdos, os Tribunais Administrativos e Fiscais (TAF) são a defesa dos cidadãos perante o Estado (em sentido amplo) e perante o “Fisco”.

Por opção política/legislativa, os TAF constituem uma jurisdição autónoma (paralela à dos Tribunais Judiciais), que é gerida por um órgão próprio (o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais), composta pelo Supremo Tribunal Administrativo, pelos Tribunais Centrais Administrativos, pelos Tribunais Administrativos de Círculo e pelos Tribunais Tributários (sendo que estes dos últimos podem funcionar agregados, como sucede na RAM). Ou seja, tendo em conta as especificidades desta jurisdição, o legislador optou por autonomizá-la, opção que também foi acolhida em inúmeros países, mas não é imperativa, existindo muitos outros em que os TAF estão integrados nos Tribunais Judiciais, sendo “secções” especializadas destes.

Pelos mais variados motivos, os TAF sempre constituíram uma área “problemática” do sector da Justiça. Em concreto, fruto de normas processuais que nunca garantiram os direitos dos particulares, demoras inadmissíveis, decisões parciais e falta de meios, os TAF sempre foram o “parente pobre” da Justiça e do Estado de Direito. E os prejudicados, claro está, são/foram os cidadãos.

No entanto, no ano de 2004 os TAF foram alvo de uma “revolução”, decorrente da denominada “Reforma do Contencioso Administrativo”. Foram criados inúmeros TAF, espalhados por todo o país, foram recrutados novos Juízes e foram introduzidas regras processuais que, finalmente, seriam aptas a garantir a tutela/defesa efectiva dos direitos dos cidadãos perante o seu “Big Brother”.

Infelizmente, volvidos mais de 15 anos, conclui-se que nem tudo correu bem. As normas processuais foram sendo sucessivamente alteradas, sempre em benefício da parte mais forte, os TAF continuam a debater-se com falta de meios e as demoras persistem, sendo, nalguns casos, “faraónicas”.

Deixo-vos aqui dois exemplos:

Iniciou-se esta semana o julgamento de uma acção administrativa que deu entrada no TAF do Funchal no ano de 2005, referente a danos alegadamente causados por uma empreitada executada e concluída neste mesmo ano. Esta acção não teve, até hoje, qualquer decisão/sentença de fundo, nem existiram quaisquer recursos.

No ano de 2006 dei entrada de uma acção administrativa no TAF de Ponta Delgada. A respectiva Sentença foi proferida em Julho de 2011. Acto contínuo recorri da mesma para o Tribunal Central Administrativo Sul. Até hoje, este Tribunal nada fez, nem sequer um mero despacho de expediente.

Em ambos os casos estão em causa indemnizações reclamadas por particulares, que (des)esperam para saber se têm direito às mesmas e, tendo, quando é que as receberão. Particulares que, neste momento, e de acordo com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já têm direito a receber uma indemnização por demora excessiva na conclusão dos seus processos.

Dito isto, a sujeição do Estado à Lei e aos Tribunais é uma característica essencial de qualquer Democracia. E quanto melhor (ou de forma mais eficaz) funcionarem os TAF, mais e melhor Democracia temos.

Assim sendo, a quem é que interessa que os TAF funcionem sistematicamente mal?

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