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Haja Misericórdia!

Enquanto associada, senti-me no dever de escrever este artigo a propósito de afirmações e opiniões pouco fundamentadas sobre a Misericórdia da Calheta e edifício do Centro de Saúde da Calheta. Independentemente do motivo de tanta indignação expressa, não é justo, nem correto que se desvalorize ou negue o papel desta instituição centenária. É injusto e ofensivo para quem trabalha naquela casa, mas sobretudo para os órgãos sociais que dão o seu tempo e esforço à causa social, sem retorno pecuniário. Uma coisa é discordar de decisões ou propostas, outra coisa é acusar.

Também, enquanto associada da misericórdia, eu tenho acesso aos relatórios e contas que são apresentados todos os anos, em assembleia geral, abertas a todos aqueles que fazem parte da mesma.

A Misericórdia da Calheta foi fundada em 1535, para prestar assistência social e hospitalar às pessoas pobres da Calheta. Começou ali a sua longa história que chega até aos dias de hoje. Apesar de ter passado períodos conturbados, a verdade é que a Misericórdia da Calheta foi se adaptando aos tempos e às necessidades da população a quem presta serviço.

As IPSS não são empresas que procuram o lucro, mas também não têm de ser geradoras de despesa e sorvedouros de dinheiro, sem utilidade pública. Para isso, conta a boa gestão das receitas e despesas de uma casa que emprega largas dezenas de pessoas e presta diversos serviços de apoio aos idosos. Se há a comparticipação dos utentes, se há acordos com a Segurança Social, se há donativos e doações, tudo serve para viabilizar um projeto de assistência social tão importante para o concelho e que se mantém vivo apesar das vicissitudes. Se a misericórdia dá lucro, esse lucro reverte para a causa social e não para engrossar a conta pessoal dos dirigentes.

Um dos argumentos que importa esclarecer e que circulou pelas redes sociais foi que as misericórdias enriquecem com os jogos santa casa. Ora, quem gere os milhões de euros arrecadados com os jogos sociais é a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, que beneficia de um terço das receitas dos jogos para prosseguir com a sua missão. As misericórdias espalhadas pelo país não beneficiam diretamente. Se a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa conta com a receita mensal dos jogos sociais, as restantes Casas não.

A principal atividade da Santa Casa é a ação social que presta, em Lisboa, a vários grupos vulneráveis, por vezes em complemento ou substituição do próprio Estado. Os principais destinatários das medidas de ação social são idosos, crianças, jovens, deficientes e doentes.

Na segunda linha de despesas surge a saúde, setor no qual a Santa Casa de Lisboa é a proprietárias de quatro instituições. De acordo com as contas disponíveis, todas estas instituições apresentaram prejuízos no ano passado e dependem financeiramente da Santa Casa. Em 2018, a Santa Casa, em termos de despesas, teve 255M de despesa corrente (133M com pessoal); 121M de despesas sociais; 55,9M de despesas com Saúde; 32M em subsídios.

Ao contrário da maioria das misericórdias espalhadas por todo o país e regiões, os órgãos sociais da Santa Casa de Lisboa recebem um vencimento, pelas funções que ocupam, que é fixado pelo governo e os elementos da mesa, liderada pelo provedor, são nomeados pelo ministro da Segurança Social, ouvido o provedor.

Esta instituição centenária remonta a 1498, no reinado de D. Manuel I, cuja irmandade se dedicava a ajudar os pobres, doentes e presos. Continuou a sua atividade, que passou por acolher crianças abandonadas, apoiar as mães carenciadas, prestar de cuidados médicos, distribuir alimentos, financiar várias instituições em Lisboa, fundar creches, escolas, unidades de saúde e de reabilitação, promover a cultura.

Não querendo fazer o papel de advogada da Misericórdia da Calheta, pretendo, tão só, contribuir para o esclarecimento da população e manifestar reconhecimento pela missão que levam a cabo, mesmo que pelo caminho cometam erros, como é próprio de quem toma decisões. Haja humildade para os corrigir.

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