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Dedução e indução

Passando aquém Atlântico, na Azambuja surgiu um primeiro surto de Covid-19 nas indústrias alimentares

As formas de abordar a investigação científica podem ser variadas, mas no fundo são apenas duas: a dedução e a indução.

A dedução assenta em partir do particular para o geral, e é o modelo da investigação matemática; não depende da observação ou da experimentação, mas do sequenciar de um raciocínio lógico.

A indução assenta na avaliação de factos ou acontecimentos, de modo a generalizar os dados recolhidos e criar uma norma que explique casos semelhantes; baseia-se, portanto, na observação e na experimentação.

Na Europa, depois da contestação da ciência clássica de Aristóteles, o método indutivo impôs-se, através da observação e da experimentação.

Por vezes, torna-se necessário voltar às origens, face a movimentos atuais em que o primado da intuição se sobrepõe ao da investigação.

Unidades de processamento de carne no centro dos Estados Unidos revelaram-se um foco e um dos elos mais fracos nos surtos mais preocupantes da pandemia do Covid-19. São espaços onde os funcionários trabalham em condições muito difíceis, ombro com ombro, e com muito fracas medidas de segurança.

Porquê? Como sempre, quando se trata de trabalho com mão-de-obra intensiva, a solução é recorrer a pessoal de menores recursos e formação, nomeadamente imigrantes (deixemos de lado se legais ou ilegais, por redundante).

Portanto, o alojamento precário, a falta de condições de higiene, a alimentação deficiente, a inexistência de cobertura sanitária, levaram à formação de um grupo de risco. Naturalmente, com o alastrar exponencial do número de casos de infetados, muitas empresas viram-se forçadas a fechar as portas.

Claro que o Presidente Donald Trump reagiu, à sua maneira: decretou de imediato a continuação da laboração, ao abrigo do Defense Production Act, uma medida para situações de guerra – na prática, considerando as fábricas de processamento de carne como infra estruturas críticas para a segurança nacional. Com a mesma determinação que um general da I Guerra Mundial determinava o assalto a uma posição fortificada, do conforto do seu quartel-general na área de retaguarda.

Passando aquém Atlântico, na Azambuja surgiu um primeiro surto de Covid-19 nas indústrias alimentares, tendo o número de infetados subido para mais de uma centena de trabalhadores, além de habitantes locais também infetados.

Pelo método indutivo, qual seria a conclusão? Uma vez que em comum está o processamento de carnes, o mais simples seria dizer que era ali que residia o problema.

Como aquele cientista que, tendo cortado as patas à pulga amestrada, quando ela deixou de cumprir a ordem de saltar, concluiu que o corte das patas conduzia à surdez.

Muito mais cómodo do que reconhecer que as condições materiais de quem lá trabalha estão abaixo das normas europeias, tidas como básicas.

Ao contrário da razão fundamentada numa abordagem indutiva, base de toda a ciência experimental: as mesmas causas, nas mesmas circunstâncias, produzem os mesmos efeitos.

Séculos de emigração madeirense são o testemunho dessa verdade indesmentível.

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