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Meus caros amigos, é insegurança ou drama social

Assistimos todos os dias na nossa cidade, alguns indigentes, os sem abrigo, os toxicodependentes, alguns deles adolescentes, nas ruas em situação de vulnerabilidade pessoal e social, expostos a diversos riscos como álcool, a violência, uso de drogas, furtos, roubos, atos de vandalismo, abusos sexuais, doenças, enfim, situações que esburacam o ideal da sociedade funchalense, o que parece ter como efeito a tal “sensação de insegurança” que todos falam e “sentem” e os meios de comunicação social escrevem.

Desengane-se o estimado leitor: este artigo não é para apontar os culpados desta situação (ainda que tal tema desse pano para mangas) nem para fugir às responsabilidades por parte da Polícia e dos seus profissionais (por vezes em sentido literal).

O título desta crónica deverá fazer sentido (espera-se…) um pouco mais para a frente. Mas, quem vive no centro do Funchal há muito se habituou, se é que tal é possível, aos sem abrigo e os toxicodependentes aos gritos, cidadãos etilizados a altas horas da noite, aos murros e pontapés que dão nos caixotes do lixo e nas portas das lojas e das residências, às discussões e à pancadaria entre eles, enfim, a um rol de atos que, numa cidade dita normal e turística, nunca aconteceria.

O facto é que todos estes problemas, tem a mesma origem, na pobreza, na droga e o no álcool, são “enigmas” sociais, portanto de atribuições de outros setores da administração, como está a acontecer, acabam caindo sempre nas mãos da polícia, como se fossem todos de sua responsabilidade e esta força, fosse capaz de tudo resolver.

O paradoxo é tão grande que o Estado, que têm a obrigação de prover as suas instituições civis e até as de solidariedade social, dos devidos meios e recursos para bem desempenharem as suas funções, acabam num determinado momento jogando a culpa do seu fracasso, à PSP, como se estas não fizessem parte da sua administração, e não precisassem do necessário apoio governamental, para fazer o que a lei lhe determina (tratamento de forma compulsiva para aqueles indivíduos toxicodependentes que não manifestam vontade de mudar e não aceitam as respostas sociais e clínicas).

Os problemas sociais sinalizados na cidade do Funchal (e não sentimento de insegurança, como alguns de forma ignorante falam) agora agravados pela pandemia ditados pela miséria em geral, e em especial pelo aumento desmesurado no consumo de drogas e de álcool e outros fatores que implicam na criminalidade, não são uma responsabilidade da polícia, mas da sociedade como um todo que precisa envolver-se nestes problemas pesquisando e encontrando soluções, e trabalhando diretamente em todos os setores.

Toda a vez que a polícia é procurada por alguém, pretende esta pessoa que ela seja capaz de resolver todos os seus problemas e não quer saber o interessado se isto está dentro da sua competência ou não. Por não ser uma instituição conhecida, a sociedade acaba mitificando a polícia e acreditando que ela é aquela instituição retratada em filmes que dão notícia de uma incomum competência e capacidade em tudo resolver.

Não compreendem que a realidade não é aquela dos filmes em que tudo se resolve em cerca de duas horas, terminando a história com um longo beijo entre o casal. Diante disto, proliferam as cobranças como se o crime e os problemas sociais amplamente conhecidos fosse uma atividade a ser combatida unicamente pela polícia.

A questão é que mesmo aqueles setores que não estão afetos à PSP, acabam sendo tratados por ela. Tudo acaba sendo responsabilidade da polícia como se ela não dependesse de um complexo sistema legal ao qual se submete como ocorre com qualquer órgão da sociedade.

Isto já se enraizou de tal forma na cultura popular que, se a polícia não atende, é acusada de omissa. Não há cobranças aos órgãos responsáveis, mas à polícia unicamente.

Diante destes fatores que já fazem parte da nossa cultura, é natural que a polícia, sobrecarregada de tarefas enquanto outros órgãos descansam à noite, nos feriados e fins-de-semana, seja tida as vezes como ineficiente, eis que, fazendo mal, apesar da boa vontade, o que não é da sua competência, acaba deixando de fazer bem feito o que sabe e é da sua atribuição.

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